Tecnologias
- Lanterna
- 21 de abr.
- 2 min de leitura
Acabou de sair, fresquinha, uma nova temporada de Black Mirror, a série distópica, ultra futurista (mas nem tanto), que capta os maiores temores da humanidade diante de uma sociedade tomada pela tecnologia, e, por dispositivos de controle, que a princípio úteis, logo tornaram-se mais fortes que nós.
Quase como um complexo, não acha?
Primeiro nasce, com a destinação de nos proteger (mesmo sem sabermos), depois cresce, toma nosso comportamento e, finalmente, cumpre seu papel de autonomia, escapando-nos do alcance, refletindo, sem querer, impulsos retidos de dentro para fora.
Com Black Mirror é mais ou menos a sensação de "soltar os monstros".
E, como envolve o bem-estar coletivo, está carregado de dramas éticos.
Vetores de acesso com correspondência às memórias (nossas e de outras pessoas), repassam, em mínimos detalhes, conversas, encontros, situações para apurarem toda sorte de discussão que possa vir a aparecer.
Pessoas em coma, que retornam à vida comum com chips cerebrais e, planos de cobertura parecidos com os de celulares para mantê-las de pé.
Universos inteiros, compactados numa única consciência, após a estabanada junção de drives no computador matriz.
Inovações na verdade magníficas, mas quase estampadas com avisos de se não surgem para nós, em vagarosas etapas, as nossas próprias dificuldades humanas, pincipalmente no que se referem a lidar com o espaço do outro, poderiam trazer inúmeras catástrofes.
A tecnologia mexe com todos os espaços privados de uma forma bastante generalista, porque atinge públicos inteiros, mais do que a um ou outro indivíduo, mas ainda assim, afeta o mundo particular, a personalidade subjetiva, quantos forem as possibilidades de estilo de vida moderno, e daí, talvez explique a pecha de ser vista como perversa por alguns, justamente porque seus resultados estão a perder a vista.
Nesse ponto, esbarramos no que pode ser considerado o eixo central da psicanálise: a mente humana.
As limitações da persona, do ego. As subjetividades em formação.
As durezas de mecanismos de defesa, digladiando-se com novidades externas.
Enfim, o ponto crítico de qualquer crise identitária: a libido.
O posicionamento das nossas predisposições individuais, o foco das nossas vontades, escolhas, validações, perante um inconsciente coletivo marcado por influências.
Mas como se sabe, o inconsciente coletivo tem muito do senso comum, do tabu, da tradição, da repetição de valores e princípios, que nem sabemos bem a origem.
A tecnologia desafia esse inconsciente, provocando revoluções de pensamento. É como se estivéssemos com o guarda-roupa cheio de roupas de inverno num dia quente de verão.
É preciso nos adaptar.
E evitar que a tradição nos prenda ao medo pelo medo.
Afinal, com ou sem o avanço das tecnologias, sempre nos haverá questões externas superiores ao estágio de nosso desenvolvimento pessoal.
É amedrontador imaginar que em meio a tanto caos social, econômico, geopolítico, nos venham barreiras ou imposições ainda mais problemáticas.
Mas na verdade, o leque poderá nos proporcionar mais opções. Com mais opções, somos pressionados a fazer escolhas e entrarmos, pessoalmente, em dilemas éticos até então deixados com a massa política, pública, exterior.
As tecnologias ingressam agora em pontos pessoais. Pessoalmente, como nos afetaria, afeta e afetará?

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