Ripley é a nova minissérie Netflix de 2024, mas a história já é bem conhecida pelo público que já teve o prazer de se deleitar com o longa de mesmo nome, lançado em 1.999, mas estrelado por Matt Damon e Jude Law.
Com uma bela fotografia em preto e branco pelos ares adentro da Itália da década de 60, a trama central nos cativa também pelo cenário.
Há excesso de detalhes descritivos para ações simples, por exemplo, uma longa cena para registrar toda a ação de subir ou descer de escadas, tensionando ainda mais a pressão psicológica do telespectador à espera de movimento, contra o realismo prático dos personagens.
Thomas Ripley é um vigarista de Nova York que vive às custas de golpes e estelionatos. Um belo dia, a oportunidade bate à porta, e ele é contratado por um milionário para que convença o único filho a voltar da Itália e a assumir os negócios de família nos Estados Unidos.
Sem dinheiro ou planos melhores, Ripley aceita e se muda de mala e cuia para a Itália.
Ali começa uma longa e perspicaz história de roubo de identidade. Mas, no processo, Ripley molda-se, pouco a pouco, com cuidado e discrição, à personalidade do filho rico.
Trejeitos, roupas, estilo de vida são copiados, até o inevitável dia da fraude de assinaturas, conta bancária e passaporte. É uma história de altos e baixos, viradas e suspenses que nos faz repensar o significado da personalidade versus identidade.
Podemos ter personalidades parecidas, ou mesmo iguais, mas identidades diferentes? Ou a mesma identidade mas personalidades distintas?
Qual aspecto semântico separa essas duas coisas na vida?
Você já pode imaginar que para a psicanálise não são a mesma coisa.
A personalidade aparece como o perfil de alguém: comportamento, temperamento, conjunto de emoções que define quem é a pessoa e como ela se posiciona em interação com seu meio.
Ela sofre influências dos acontecimentos, da genética e das experiências psicológicas, mas são características geralmente percebidas pelo social.
Sabe quando entendemos aquele amigo como a pessoa perfeita para desmontar problemas? Poisé! Reconhecemos isso pela personalidade que ele sustenta.
Já a identidade tem mais a ver com a autoimagem, a noção própria de papel e posição na sociedade. Essa é bem mais fluida do que a personalidade, porque sofre interferências mais concretas, como profissão, legado, missão na comunidade. Isso altera valores, convicções e crenças.
Sabe aquele amigo que nasce rico e fica pobre, por isso perde a autoconfiança, ou vice-versa? Provavelmente ele mudou da água para o vinho depois de uma crise de identidade.
Quem sou eu? Rico sou poderoso, pobre sou fraco. A autoimagem muda conforme a crença pessoal sobre poder, status ou coisas assim.
No caso de Ripley, a identidade se tornou ambígua e a personalidade também. Ele trocava de avatar conforme a música e a oportunidade, mas é certo de que cada uma das identidades está idealmente conectada à uma personalidade que faça sentido, ou então ele é interpretado como fraude.
A astúcia na troca de identidades parece sobrehumana, e é esse o efeito garantido pelo contraste com as cenas lentas e absolutamente "triviais" que já comentamos aqui.
Embora haja diferenças, personalidade está associada à identidade e, vice-versa, há uma independência conceitual, mas uma simbiose ativa na vivência. Nas nossas relações, certos comportamentos e reações já são esperados por essa razão.
E aí, o que você achou de Ripley?
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