Divertidamente 2, lançado nos cinemas brasileiros em junho de 2024, é um jeito curioso de se explicar a "cisão" na psicanálise.
Quem é que nunca brincou de se imaginar, ou já se divertiu, assistindo a personagens divididos pelos bons conselhos do "anjinho" e pelas travessuras do "diabinho"? Provavelmente foi esse o seu primeiro contato ilustrado com a "cisão".
Essa dificuldade de reunir o bom e o mau dentro do mesmo indivíduo, pode gerar crises intensas que o separa em dois, o que é conhecido pelo fenômeno da Cisão.
Isso pode ser observado em pessoas que conseguem ser muito boazinhas em determinados momentos, mas em outros podem ser cruéis. Traumas e bloqueios, inclusive, podem gerar transtornos dissociativos, fazendo com que "personalidades distintas" tomem frente em contextos diversos.
A forma como percebemos o outro, também, ou seja, de vê-lo como todo bom ou todo ruim, pode revelar uma cisão em nós, afinal, Jung já dizia que "o ambiente só serve de superfície para projetar a sombra do paciente".
Então, às vezes, não damos vazão à nossa cisão, mas conseguimos avaliá-la no outro, sendo que, na realidade, apenas não separamos o que o outro continua nos trazendo. Isso pode ser confirmado pela comparação do que penso do outro em relação ao que outras pessoas próximas também pensam.
Provavelmente não há unanimidade e, uma mesma pessoa pode ser amada e odiada ao mesmo tempo.
Assim, a cisão na psicanálise é um conceito que descreve como a mente humana lida com conflitos internos insuportáveis, dividindo experiências ou sentimentos contraditórios apenas em bom ou mau.
Originado nas teorias de Melanie Klein, este conceito é fundamental para entender certos comportamentos e sintomas psicológicos. Na prática terapêutica, a integração dessas partes cindidas é um objetivo central para promover a saúde mental e o bem-estar do paciente.
Em Divertidamente 2, esse processo de reunião do bem e do mau em um mesmo caráter é tema central da história.
No processo de juntar todas as experiências, as emoções e os mecanismos de defesa, como a negação, são etapas que não parecem ser ultrapassadas pelo mero enfrentamento, mas que ficam, são coexistentes e manejáveis durante todo o processo de desenvolvimento psíquico e durante o envelhecimento da pessoa.
É interessante explicar que a cisão é um mecanismo de defesa utilizado para proteger o ego de sentimentos ou pensamentos conflituosos.
Quando uma pessoa não consegue integrar aspectos positivos e negativos de si mesma ou dos outros em uma única percepção, a mente os separa em compartimentos distintos, como se fossem "caixinhas".
Freud não utilizou o termo "cisão" da mesma forma que é compreendido atualmente, propriamente, mas ele descreveu mecanismos de defesa como a repressão e a dissociação, que são conceitos relacionados com muita proximidade ao que vemos como cisão hoje.
A emoção "alegria", por exemplo, jogava para o subconsciente de Riley, agora adolescente, qualquer memória difícil ou problemática que pudesse gerar nela um conflito de cisão, fortalecendo apenas a convicção de ser ela "uma boa pessoa".
Com o desenrolar do seu crescimento, entrando na puberdade, a jovem precisa abrir espaço para novas emoções, como a "Ansiedade" e a "vergonha", gerando nela o início de um processo de cisão que a leva a fortalecer apenas a convicção de "não ser capaz".
Percebemos que a reunião e o fluir de todas as memórias, despertadas por emoções consideradas tanto negativas quanto positivas, são influentes na disruptura de sua personalidade, que primeiro passa por uma cisão antes de se sofisticar com uma alternância de avaliação em sua autocrítica.
Riley, e todos nós, estamos sujeitos a sentir, reprimir, extravasar e a dissecar partes da nossa história para declararmos quem seremos nela. Isso pode ser sentido mais intensamente na puberdade, mas estamos nesse processo circular até o fim da vida, uma vez que nossas memórias e experiências são rotativas e contínuas, o que pode ser desesperador.
Na terapia psicanalítica, um dos objetivos é ajudar o paciente a reconhecer e a integrar as partes cindidas de si mesmo e dos outros. Isso envolve a aceitação de que aspectos positivos e negativos coexistem dentro das pessoas e das experiências.
Faz parte da resolução de conflitos a integração dessas partes cindidas, o que pode reduzir a ansiedade e o sofrimento, permitindo que o indivíduo desenvolva uma visão mais realista e equilibrada da realidade. Isso pode levar a um aumento da capacidade de lidar com conflitos, tensões e adversidades de maneira saudável e duradoura. :)
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