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Angústia

Foto do escritor: LanternaLanterna

“Um filho” é uma produção de 2023, coestrelada por Hugh Jackman e Anthony Hopkins, que descortina o drama familiar das relações pai e filho.


Divorciados, os pais do adolescente Nicholas seguem totalmente independentes, até o dia em que a mãe procura o pai para dizer que Nicholas tem faltado à escola.


Com um recém-nascido em casa, o pai, quem havia tocado a vida com um novo casamento, recebe Nicholas para morarem juntos.


Beth, a nova esposa, está relutante no início, mas com os apelos da situação, cede em favor do marido, muito confiante de que o comportamento de Nicholas melhoraria com a presença de uma família “completa”.


Uma vontade grande de completude, e de fazer a diferença, é sentida pelo pai de Nicholas como fruto da experiência dolorosa que teve com o próprio pai.


O avô de Nicholas é um homem duro, enterrado no trabalho, crítico e frio o bastante para ter afastado os familiares mais próximos ao longo da carreira paterna.


Prometendo ser alguém diferente para os filhos, o pai de Nicholas tenta se aproximar e demonstrar interesse pelas questões que, evidentemente, afetam a vida particular do adolescente e o relacionamento entre eles.


No entanto, mais do que as questões típicas da adolescência, Nicholas enfrenta um sofrimento mental crônico e constante, amenizando as dores emocionais com automutilação.


Tomado por imensa aflição, o menino falta às aulas para caminhar, chora sem motivo aparente e tem crises que o levam a cortar os braços e a se isolar socialmente de pessoas da mesma idade.


Sem entender, pois trata o filho com amor, o pai de Nicholas se apega a pequenos gestos que deixam o menino feliz, voltando com ele aos tempos anteriores ao divórcio. Aqui deixo um pequeno parênteses sobre ‘regressão’ na conduta de defesa do ego.


Às vezes recuperamos papéis infantis para encontrar conforto emocional na memória afetiva familiar, algo comum de se perceber nos adultos que não se desligam de hábitos e gostos da infância, não só por serem recordações positivas, mas porque proporcionam reações emocionais que lembram satisfação.


Por mais que tenhamos tido uma infância difícil, sobrevivemos a ela. Isso inconscientemente nos consola, ao dizer que apesar de nos sentirmos agora mentalmente impotentes, já sobrevivemos, ou vivemos, momentos que vencemos/suportamos.


No filme, uma arma de caça, passada de pai para filho ao pai de Nicholas, pode ser vista como ‘totem’ do elo geracional, algo sutilmente sugerido ao longo do roteiro como representativo da violência que enlaça a estrutura da família, por mais que cada pai tenha tomado uma via diferente de ação.


Não só é um símbolo atencioso de carência, como uma recomendação figurada de que os nossos parentes não são o modo como os tratamos, mas que são o que são porque existem como indivíduos inseridos no mundo e nos testes de vida.


Por mais que a gente tome expectativa com boas intenções, atribuir algo nosso, ou do nosso passado à realidade dos filhos é um processo inconsciente de projeção.


A projeção nos tira do lugar do outro e nos duplica, exatamente para tomarmos esse lugar que não nos pertence na essência. Esse é um processo violento de dinâmica relacional, que em algum nível esconde angústia e que não necessariamente é expressado com agressividade.


Foi tão doloroso a nós termos passado pelo que passamos que não queremos que alguém querido se sujeite ao mesmo, entendendo a gente que nossos conselhos (projetados) servirão de atalho para um bom resultado.


Nisso entram planejamentos e meios com os quais nos relacionamos mais do que aqueles a quem queremos dar esse destino.


Por muito tempo na psicanálise o angustiado e o ansioso foram estudados como neuróticos. Neuroses geram círculos viciosos de necessidades neuróticas, como docilidade extrema, isolamento, hostilidade.


Para Karen Horney a angústia é o núcleo da neurose. É um sintoma de um perigo oculto e subjetivo, tacitamente impregnado pelo medo de ser ameaçado.


A autodestruição nos é apresentada como uma das formas de libertação da angústia. No estudo de Horney, ela nos ensina que se a angústia se associa à determinada atividade, e no contexto do filme podemos associar “atividade” à “vida”, a pessoa passa a crer que a atividade difícil não é importante ou não é para ela. Isso mexe com o nosso pertencimento e merecimento.


Um exemplo mais simples é sermos sempre rejeitados pelos times de esportes. O preterido vai desvalorizar o esporte e evitá-lo. Pela angústia, podemos “cavar”, por assim dizer, o fator causal de inibição de comportamentos.


Não vou contar o fim do filme porque ele vale seu tempo de tela. O drama está no top 10 da Amazon Prime Brasil. Depois conta pra gente o que você acha :)






 
 
 

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